Processos do futuro: química de fluxo

Projetos de processos mais simples e energeticamente mais econômicos são fundamentais para a implementação da química verde nas indústrias. Contudo, a inclusão dessa metodologia no ambiente industrial é ainda atrasada por algumas barreiras.

Uma delas é o fato de já existirem muitos processos considerados ‘não-verdes’ otimizados e bem estabelecidos nas fábricas. Estas, por sua vez, podem ter perdas relacionadas tanto ao subaproveitamento do capital já investido para a produção atual, quanto burocráticas — relativas à regulamentação de novas rotas para obtenção de um mesmo produto.

Neste contexto, para tentar superar estes fatores, alguns autores sugerem que há a necessidade do desenvolvimento de novas tecnologias para o processamento industrial. Dentre essas tecnologias, está a química de fluxo, apontada como uma das tecnologias emergentes em química por muitos pesquisadores.

Para entender melhor sobre como isso pode ocorrer, neste artigo falaremos do confronto entre os processos em batelada e contínuo, dos reatores que se destacam na tecnologia de química de fluxo hoje e a possibilidade de utilizá-los em escala industrial.


Imagem de Peter H por Pixabay.


Processo: Batelada x Contínuo

A química de fluxo consiste, basicamente, na condução das reações de modo contínuo. Para que isso ocorra, são necessários reatores que possam operar dessa maneira, como vários daqueles que são estudados nas disciplinas de Cinética da graduação.

Como Fogler (2009) fala já nas primeiras páginas do seu livro, transformações em batelada são muito convenientes em pequena escala (laboratórios, por exemplo), em testes de novos processos e na fabricação de produtos caros.  

Afinal, havendo tempo suficiente, conversões de reagente altas podem ser obtidas. Como o preço da mercadoria final é elevado, o aumento do custo operacional, neste caso, pode não ser um impeditivo econômico para a fábrica.

Contudo, é preciso tomar nota das variabilidades de processo que podem ocorrer a cada batelada feita nestes reatores e das limitações de escalonamento da produção. Uma vez que a operação no reator é interrompida a cada lote.

Além disso, há desafios associados ao acompanhamento e controle das variáveis de processo. Já que o sistema, neste caso, é necessariamente transiente.

Em regimes contínuos, por outro lado, o controle de parâmetros de reação e mistura podem ser mais eficientemente controlados e há menor custo associado às otimizações de condições reacionais.

O escalonamento é facilitado e, dependendo do processo, pode haver inclusive redução na quantidade de operações unitárias envolvidas na fabricação do composto desejado. Em outras palavras, a eficiência energética dos processos contínuos é, geralmente, maior.

Reatores em fluxo

A química de fluxo pode ser caracterizada por um conjunto de reatores tubulares, classificados de acordo com seus volumes: nano reatores (15 nL - 10 μL), micro reatores (10 μL - 100 μL), mini reatores (50 μL - 200 μL), meso reatores (100 μL - 10 mL) e macro reatores (10 mL - 1 L).

Dentre estes, os micro reatores têm sido apontados como uma das tecnologias que podem aproximar indústria e academia. Estes equipamentos consistem em sistemas compostos por diversos micro canais pelos quais o meio reacional flui, possibilitando a síntese contínua de substâncias.

O projeto destes reatores envolve pelo menos duas zonas: a de micromistura e a de residência, como ilustrado na figura abaixo. Na zona de mistura, os reagentes alimentados encontram-se em um ponto microscópico do reator, o que permite alta eficiência de mistura e troca térmica.

Na zona de micromistura há uma junção em formato de Y, em que é feita a mistura dos reagentes A e B. Depois de misturados, eles seguem para a zona de residência, que possui formato de tubulação.
Esquema de um micro reator baseado em Machado et al. (2014). Os reagentes A e B são alimentados na zona de micromistura e depois seguem para a zona de residência. 


Estes dois aspectos são muito importantes no projeto de reatores reais, já que zonas mortas e pontos quentes podem afetar a qualidade das reações nestes equipamentos. Como a área superficial de micro reatores é elevada, estes efeitos de não idealidade são minimizados.

Isso permite melhor controle dos parâmetros operacionais, como mencionado antes, o que pode ajudar a tornar as reações mais previsíveis e seletivas. Além disso, os micro reatores são compactos, ou seja, demandam menor espaço para a instalação.

Escalando a micro escala

A microfluídica também se difere no escalonamento. A forma tradicional de aumentar a escala de reatores envolve o aumento de seus respectivos volumes. No caso dos micro reatores, todavia, isso pode ser feito pelo aumento da quantidade das unidades.

Como falamos agora há pouco, a compactação é uma característica desse tipo de reator. Assim, uma quantidade enorme de equipamentos pode ser instalada sem refletir no comprometimento de grandes espaços dentro da fábrica.

Apesar dessas vantagens, é necessário lembrar que esta tecnologia também envolve dificuldades técnicas. Afinal, muitas das considerações termodinâmicas que estamos acostumados a fazer para as grandes escalas, não são razoáveis em micro escala.

Isso também acontece com os perfis que tanto discutimos para os fenômenos de transporte na graduação. Portanto, é requisitado um trabalho de reengenharia das transformações que envolve também estudo e aperfeiçoamento contínuos do profissional de engenharia responsável.

Felizmente, estes reatores são comumente desenvolvidos em modelos adequados para a amostragem e medição em tempo real das variáveis de processo. Por facilitarem a coleta de dados rápida e confiável, eles também se colocam como parte das transformações da indústria 4.0 que podem definir os modelos de negócio industriais competitivos no futuro.

Diante da necessidade de melhorias de processos que ajudem a proteger o meio ambiente, encontrar novas formas de fazer projetos é fundamental para a indústria. Neste aspecto, a química de fluxo é parte do futuro sustentável do nosso setor. 

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