Panorama da produção de etanol no Brasil: o que podemos aprender?

A transição da matriz energética, de modo a incluir progressivamente mais fontes renováveis de energia, é um tema importantíssimo na engenharia química. No Brasil, a herança histórica da produção agrícola e a riqueza de recursos naturais favorecem bastante a produção de biocombustíveis, dentre os quais o etanol é um dos mais bem sucedidos do planeta.

(Imagem de Cornell Fruhauf por Pixabay)


Neste texto, vamos discutir a produção de etanol no Brasil nos últimos anos. Além de tentar explorar algumas perspectivas futuras para esse biocombustível.

Etanol 2012-2023

Como um dos principais candidatos a substituto da gasolina, o etanol tornou-se um biocombustível cada vez mais requisitado, especialmente no Brasil, com a introdução dos veículos flex. A Figura 1 apresenta a produção média de etanol no Brasil nos últimos anos.
Figura 1: Produção anual média de etanol.
Fonte: ANP 

Como é possível observar, a produção de etanol apresentou tendência de crescimento até 2019, quando houve interrupção de diversas atividades industriais, e voltou a se recuperar no último ano. Na Figura 2, é possível observar o comportamento médio da produção do biocombustível ao longo do ano.

Figura 2: Produção de etanol média por mês entre 2012 e 2023.
Fonte: ANP

A principal matéria-prima para a produção de etanol no Brasil é a cana-de-açúcar, que possui caráter sazonal. Durante os meses de setembro a janeiro, há foco no plantio e desenvolvimento das culturas desta planta, enquanto a colheita ocorre nos demais meses do ano.

A predominância da cana como fonte de açúcar para a fermentação alcoólica no país é ilustrada na Figura 2. Como é possível observar, a produção média do biocombustível atinge valores máximos nos meses de julho e agosto.

Principais regiões produtoras

A principal região produtora de etanol no Brasil é o Sudeste, especialmente o estado de São Paulo. Contudo, nos últimos anos, a contribuição da região Centro-Oeste aumentou consideravelmente, como é possível notar na Figura 3.
Figura 3: Produção anual de etanol por região do Brasil.
Fonte: ANP

O crescimento da produção no Centro-Oeste se deve especialmente a investimentos feitos no estado do Mato Grosso, cuja produção anual praticamente quintuplicou entre 2012 e 2023, como é mostrado na Figura 4.

Figura 4: Produção de etanol no Centro-Oeste.
Fonte: ANP

Uma justificativa para esse crescimento é a elevação da produção de etanol do milho. Entre as safras de 2017/2018 e de 2022/2023, a produção nacional do biocombustível advindo desta matéria-prima aumentou cerca de 800%. A maior parte desta produção ocorre na região Centro-Oeste.

Dentre as vantagens do milho, está a possibilidade de atenuar os efeitos de sazonalidade da cana, uma vez que é possível estocar o cereal o ano todo. Devido à alta disponibilidade de sacarose na cana, este mesmo armazenamento não é possível. De modo que há a necessidade de processamento rápido da cana-de-açúcar, para evitar comprometimento da qualidade da matéria-prima.

Contudo, a expansão do uso do milho para a produção de biocombustível pode estar associada a vários problemas de sustentabilidade. Além do desmatamento para a expansão das plantações, também é necessário ressaltar que o milho é utilizado para a alimentação tanto humana, quanto animal, de modo que há aumento da competitividade pelo alimento..

As monoculturas de milho também disputam por área plantada e recursos hídricos com outros cereais, fundamentais para o abastecimento da indústria alimentícia. O desbalanceamento destes fatores podem resultar em prejuízos sociais para o país, e não devem ser preteridos em função da questão energética.

Expansão, industrialização e desenvolvimento

À medida que os investimentos aumentam, também é esperada maior empregabilidade. Especialmente no Centro-Oeste, onde as indústrias de produção a partir do milho continuam a crescer.
Figura 5: Principais estados produtores de etanol em 2023.
Fonte: ANP

À medida que a expansão da indústria de etanol é integrada nas políticas de descarbonização dos governos, maior é a tendência de descentralização da produção e desenvolvimento de diferentes regiões do país. Todavia, enquanto a sustentabilidade e o meio ambiente são divulgados como o motores para investimentos e incentivos por parte dos governos, o aumento da participação de cereais na produção de etanol deve ser visto com cautela.

O etanol de primeira geração é uma solução de curto prazo, extensivamente criticada na literatura científica. Pois a aposta descuidada nesta fonte de energia pode estar associada a várias outras problemáticas, como já ocorreu no passado.

Deste modo, apesar do crescimento do setor ser positivo, este não pode ocorrer sem a demanda por maior pesquisa e desenvolvimento na indústria de biocombustíveis. Somente assim é possível substituir as matérias-primas utilizadas em grande escala agora por alternativas mais sustentáveis.


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